terça-feira, 23 de abril de 2024

Jay McInerney - "As Mil Luzes de Nova Iorque" / "Bright lights, big city"


Jay McInerney
"As Mil Luzes de Nova Iorque" / "Bright lights, big city"
Paginas:171
Quetzal

Jay McInerney viveu um pouco como Jim Morrison, quando era pequeno, sempre de um lado para o outro, quase “coast to coast”, é simpático e o êxito não lhe subiu à cabeça revelando-se um pouco como um dos herdeiros da grande tradição literária norte-americana, ao mesmo tempo que a sombra desse génio chamado Francis Scott Fitzgerald paira sobre ele, basta recordar essa obra-prima que é “Brightness Falls”/”Quando o Brilho Cai”, retrato de uma geração, cuja capa da primeira edição portuguesa na Asa tem uma fotografia das célebres torres gémeas do World Trade Center, sendo o romance apenas um dos mais belos da literatura norte-americana de todos os tempos.


Jay McInerney possui a tal “carteira” universitária e teve como professor esse génio da “short-story” chamada Raymond Carver (dele falaremos um dia destes) e se alguns se recordam de uma emissão do “Artes e Letras” (já lá vão uns anos largos), que foi dedicada precisamente a Raymond Carver, lembram-se certamente da forma comovida como Jay McInerney falou dele e da sua obra ao lado de Tess Galagher, a esposa do escritor.

Seria através das “short-stories” publicadas na “New Yorker” e na “Esquire” que muitos fixaram o nome do então jovem e desconhecido Jay McInerney, mas a sua magia literária irá ser dada a conhecer ao mundo com a publicação de “As Mil Luzes de Nova Iorque” / “Bright Lights, Big City”, uma novela acerca da “Big Apple” e da sua “fauna” escrita em apenas seis semanas, que tem a a abrir uma citação de “Fiesta” de Ernest Hemingway:

“- Como é que foste à falência? – perguntou Bill.
- De duas maneiras – respondeu Mike. – Gradualmente e, depois, de repente.”

Jay McInerney

De imediato Jay McInerney foi apontado, e bem, como um dos “wonder-boys” da nova literatura norte-americana e, como não podia deixar de ser, Hollywood comprou os direitos do livro e o filme nasceu realizado por James Bridges e com o Michael J. Fox no protagonista, como muitos devem estar recordados: era o mundo da moda e não só, com o célebre Studio 54 a fervilhar de sangue, suor e lágrimas. E nunca será demais referir que foi o próprio Jay McInerney que assinou o argumento da película, algo bastante raro no sistema dos Estúdios, e que se revelou excelente, porque o escritor nos ofereceu o melhor da sua escrita, como argumentista.

«Ela dá um passo em frente e beija-te. Devolves-lhe o beijo prolongando-o. O tempo passa. Sentes-te excitado. Pensas em dizer-lhe para ir ao teu apartamento, depois achas melhor não. A renúncia é, por vezes, mais doce que a realização.»

Jay McInerney
in "As Mil Luzes de Nova Iorque"


Seguiram-se “A História da Minha Vida” / “Story of my life”, ainda um pouco a mesma temática (novela), ao mesmo tempo que as suas “short-stories” viam as suas arestas a serem limadas e aperfeiçoadas até à exaustão, sendo publicadas em diversas revistas.

Quando “Brightness Falls” / “Quando o Brilho Cai” saiu, todos se renderam à sua genialidade e aqui ele, de uma forma inteligente, saiu da grande metrópole e procurou territórios mais propícios para a sua escrita nascendo “Modelos” / “Model Behavior”, uma novela fabulosa acerca do mundo da moda, depois regressou às colectâneas de contos e não resistiu a ir buscar as personagens de “Quando o Brilho Cai” para uma das histórias e a elas irá regressar novamente muitos anos depois.


E quando todos nos interrogávamos qual seria o caminho a seguir por Jay McInerney, a novela ou o conto, surge um belíssimo romance com os blues e a amizade como pano de fundo, estamos a falar de “O Último dos Savage” / “The Last of the Savages”. A obra tem uma força visual e musical de tal ordem que por vezes o leitor se sente a navegar no Mississipi profundo, em busca da célebre encruzilhada do diabo, que “Walter Hill” nos ofereceu no seu magnifico movie “A Encruzilhada” / “Crossroads”, em que o território dos blues era surpreendentemente invadido por um duelo de dois guitarristas, um com o seu hard-rock e o outro a recriar Bach, como se o compositor fosse um daqueles mestres do blues e como não podia deixar de ser o autor deste duelo só poderia ser o genial Ry Cooder.

A obra literária de Jay McInerney é uma das mais fascinantes da Literatura Contemporânea norte-americana e recomendamos vivamente a sua descoberta.

Rui Luís Lima

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