segunda-feira, 29 de abril de 2024

Yukio Mishima - “O Tumulto das Ondas” / "Shiosai"


Yukio Mishima
“O Tumulto das Ondas” / "Shiosai"
Páginas: 174
Relógio D’Água

Foi através de um texto de António Mega Ferreira (*) publicado no JL – Jornal de Letras, na época em que ele era chefe de redacção, que descobri o escritor Yukio Mishima, o alvo era a publicação em Portugal de “O Marinheiro que Perdeu as Graças do Mar” e desde então tenho lido tudo o que encontro do autor japonês, depois temos o celebre filme que Paul Schrader realizou e essa obra incontornável que Margueritte Yourcenar escreveu sobre o escritor e disponível no nosso país graças à editora Relógio D’Água que também é responsável pela edição deste belo e singular romance intitulado “O Tumulto das Ondas” com ilustrações de Catarina Baleiras.

Estamos perante um belo romance que nos narra a história de amor entre Shinji, um jovem pescador pobre e a bela Hatsue de outra condição social, mas que não será impedimento para que a chama do amor surja de mansinho e os leve a unir esforços para ultrapassar as barreiras que os separam do Paraíso. Como já é habitual nestas pequenas crónicas aqui fica um pequeno trecho deste belíssimo livro de Yukio Mishima.

Rui Luís Lima

Yukio Mishima
(1925 - 1970)

(...) "Agora, já Shinji podia entrar livremente em casa de Miyata Terukichi. Um dia que voltava, apresentou-se à porta da casa com uma camisa de colarinho aberto, de brancura impecável, e com as calças acabadas de passar a ferro; em cada mão trazia uma dourada...
Hatsue esperava-o, já pronta. Os dois jovens haviam prometido ir ao templo de Yashiro e ao farol para anunciar o noivado e transmitir os agradecimentos.
Iluminou-se a entrada de terra batida mergulhada na meia escuridão do crepúsculo. Hatsue surgiu, vestida com aquele quimono de Verão, branco, com grandes campainhas, que comprara ao vendedor ambulante. A brancura do vestido brilhante, mesmo em plena noite.
Shinji ficara à espera, apoiando-se com uma mão à porta da entrada; baixou o olhar para Hatsue quando esta apareceu e, sacudindo uma das pernas calçadas com socos de madeira, como quem espanta os insectos, murmurou:
- Os mosquitos são terríveis!
- São, não são?
Os dois jovens subiram a escadaria de pedra que levava ao templo de Yashiro. Em vez de correrem por ali acima como poderiam ter feito, preferiram subir lentamente os degraus, com os corações banhados de alegria, como para saborearem o prazer de cada degrau." (...)

Yukio Mishima
in "O Tumulto das Ondas"

(*) - O Texto de António Mega Ferreira sobre Yukio Mishima que refiro, poderá ser encontrado no livro "A Borboleta de Nabokov". (Ed. Noticias)

domingo, 28 de abril de 2024

Os Livros e o Livreiro!


Os Livros e o Livreiro!

Desde tenra idade comecei a frequentar livrarias levado pela minha mãe e avó, ao mesmo tempo que devorava na livraria dos meus padrinhos os célebres livros de banda desenhada, assim como tudo o que apanhava, quando por lá se começaram a vender os livros de bolso surgidos em inicio dos anos setenta.


A livraria foi um daqueles espaços em que se descobria autores, mas também um lugar em que era possível fazer amizades, incluindo o próprio livreiro, que nos recomendava livros e nos abria os horizontes. Guardo na memória com saudade a Livraria Opinião do Hipólito Clemente, mesmo ali ao lado da Cervejaria Trindade. Por ali descobri os surrealistas e muito mais, porque as pequenas edições de autor, tinham sempre um lugar disponível, para sorrirem ao visitante. Depois eram as descobertas que se faziam sempre em maravilhosas conversas que guardo na memória para sempre, porque muitas vezes quem se encontrava por detrás dos balcões tratava os livros por tu e porque também eram leitores.


Hoje ao entramos numa livraria, quase sempre a resposta é-nos dada pelo computador e a sua famosa base de dados. Não há tempo para conversas e ficamos quase sempre restritos às novidades, embora se o livro não existir em stock, haver sempre essa possibilidade de o pedir ao editor. Os chamados fundos de catálogo não tem direito a habitarem as livrarias, eles dormem sossegados nos Armazéns e só conhecem a luz do dia para conviver com os leitores quando chega a Feira do Livro.

Quando nos apaixonamos pela escrita de um escritor temos o desejo de conhecer a totalidade da sua obra, mas muitas vezes é quase impossível descobrir as edições mais antigas, especialmente se ele for um habitante não dado às famosas novidades.


Por outro lado a chamada crítica literária nos jornais debruça-se quase sempre sobre as novidades do mercado, esquecendo-se desses livros que já viram a luz dos dias em anos passados e que se encontram esquecidos umas vezes nas estantes, outras nos armazéns das editoras.

Resta-nos assim essa aventura que se chama Alfarrabistas onde muitas vezes descobrimos aqueles livros que ouvimos falar aos nossos pais e avós, mas que nunca nos chegaram às mãos e quando os descobrimos perdidos nesse sótão dos Alfarrabistas é na verdade o prazer da leitura que ilumina as nossas almas.


Quando entrava na Byblos nas Amoreiras recordava-me sempre da Barnes & Nobles de Santa Mónica, pelo espaço e pelo número de títulos disponíveis, incluindo os chamados “fundos de catálogo”, mas essa aventura não foi correspondida pelos leitores e o espaço encerrou.

E como não podia deixar de ser a memória leva-me a essa época em que a censura existia e os livros eram apreendidos, ainda me lembro desses tempos (início dos anos setenta) em que lia no café “O Dinossauro Excelentíssimo” do José Cardoso Pires com desenhos do Júlio Pomar, devidamente forrado, para ninguém ver a capa ou “Os Subterrâneos da Liberdade” do Jorge Amado que mão amiga tinha emprestado.


Ler faz parte da vida e um universo sem livros corresponde inevitavelmente a uma passagem cinzenta poe esta estranha vida com o fim do planeta azul no horizonte e quando nos recordamos desses copistas da Idade Média que nos ofereciam o seu labor, tantas vezes à luz das velas, queimando a vista para que a cultura não se perdesse, só poderemos olhar os livros com toda a ternura do mundo, fazendo deles o nosso melhor amigo, porque quando regressamos à leitura de um livro amado, estamos perante esse reencontro, que tantas vezes nos transforma o olhar que temos, do triste mundo em que vivemos.

Rui Luís Lima

sábado, 27 de abril de 2024

& etc - Uma editora de sucesso!


& etc nº.1
Quinzenário Cultural
(17/01/1973)
Preço: 7$50
& etc - Uma Editora de Sucesso!

Tudo começou ainda andava eu a colar as tiras dos Peanuts publicadas no Diário de Lisboa, no caderno da instrução primária, sendo o melhor aquele das duas linhas para termos uma letra bonita. Nesse ano de 1965 o Jorrnal do Fundão foi proibido de ver a luz do dia de Maio a Novembro de 1965.

"& etc" no Jornal do Fundão
Suplemento Cultural!

O jornal regional incomodava o poder e em 1967 António Pauloro (director do jornal) e Vítor Silva Tavares (editor na Ulisseia) criam um suplemento cultural intitulado "& etc", que irá abanar os alicerces do regime. Porque como alguns ainda se recordam a cultura é um veneno mortal para as ditaduras e um perigoso xarope para as democracias populistas, daí estas últimas promoverem o futebol e a competição de talentos para impedir a cultura de se exprimir, promovendo o "penso logo desisto"!

"& etc" Quinzenário Cultural
O último número da revista!

E assim, entre finais de 1967 até 1971, o Suplemento Cultural do Jornal do Fundão intitulado "& etc" tornou-se o "mal-amado" do regime e na capital começou-se a vender o Jornal do Fundão.

Vítor Silva Tavares, que fizera muitas viagens entre Lisboa e o Fundão em 1973, decide abrir o ano a lançar a "folheca cultural & etc" da qual viriam a sair 25 números, quinzenalmente, cujas capas reproduzimos anteriormente no blog, que ao longo do tempo iriam mudar de papel, o inicial era muito fino, com um formato quadrado bem definido e do qual me foi parar às mãos um exemplar numa Feira do Livro.

O primeiro livro da editora "& etc"

Seriam 25 os números a ver a luz do dia, deste dito cujo quinzenário cultural, que viria a comprar na totalidade na Livraria Opinião por 200$00, prenda de aniversário da minha avó (1) e rapidamente travei conhecimento com o Hipólito Clemente, que quando saiu o "Coisas", primeiro livro da editora & etc situada no subterrâneo 3 da Rua da Emenda, ali para os lados do Largo do Camões, guardou-me um exemplar.

O primeiro livro da colecção "subterrâneo três"

A partir de então e durante longos anos todos os livros do "& etc" do Vítor Silva Tavares (1937 - 2015), com aqueles "hors-text" fabulosos do Carlos Ferreiro e no formato 15,5 x 17,5 cm, que reproduzia de certa forma as dimensões da "folheca cultural", entraram-me em casa eram de imediato lidos.


Vítor Silva Tavares
(1937 - 2015)

Neste século XXI já não temos as fabulosas edições & etc, o seu editor Vítor Silva Tavares deixou-nos em 2015, mas ainda pior é só termos a Biblioteca Nacional e a Casa Fernando Pessoa para lermos os livros da & etc (as tiragens eram pequeninas) editados por Vítor Silva Tavares, o editor que vivia fora do sistema!

O primeiro livro da colecção "contramargem".

(1) - Vi os "& etc" atados aos molhos com cordel nos degraus interiores da Livraria Opinião que davam acesso aos andares de cima e pedi ao Hipólito que mos guardasse, e fui a correr até casa, perto de S. Bento, e a avó Rosa lá me deu o dinheiro (era a prenda de aniversário, embora só fosse no dia seguinte) e lá regressei eu a correr até à Livraria Opinião, futura editora Cotovia e hoje...

Rui Luís Lima

sexta-feira, 26 de abril de 2024

Vergílio Ferreira - "Manhã Submersa"


Vergílio Ferreira
"Manhã Submersa"
Livro de Bolso PEA nº21
Páginas: 175
Publicações Europa-América

O cineasta Lauro António realizou uma excelente adaptação cinematográfica deste livro de Vergílio Ferreira, revelando-se "Manhã Submersa" como um filme incontornável na filmografia do realizador, da mesma forma que é um livro indispensável na obra do escritor Vergílio Ferreira.

Rui Luís Lima

Philippe Sollers - "Paradis"


Philippe Sollers
"Paradis"
Páginas: 347
Points

"Paradis" pertence ao período em que o escritor Philippe Sollers escrevia os seus livros sem pontuação, referindo que o leitor deveria ler o texto à medida que respirava criando assim a sua própria respiração. Recordo que o célebre escritor que infelizmente nos deixou recentemente publicou diversos livros, segundo este método de escrita e cuja leitura termina por ser bem interessante, já que a escrita de Sollers é profundamente cativante. Infelizmente Philippe Sollers tem sido um escritor que tem sido esquecido pelas editoras no nosso país.

Rui Luís Lima

Pedro Tamen - "Tábua das Matérias" - Poesia - 1956 - 1990


Pedro Tamen
"Tábua das Matérias"
Poesia - 1956 - 1990
Páginas: 288
Tertúlia

Poeta, editor, cinéfilo e tradutor. Pedro Tamen que se estreou com o livro "Poemas Para Todos os Dias", em 1956, deixou-nos uma longa e bela obra de poesia, mas também traduções únicas como foi a obra de Marcel Proust. "Em Busca do Tempo Perdido", que leio e releio enquanto o tempo passa devagar nas margens da memória. Pedro Tamen deixou-nos a 29 de Julho de 2021.

Rui Luís Lima

Pedro Tamen
(1934 - 2021)

A Segurança Destas Paralelas

A segurança destas paralelas
— a beira da varanda e o horizonte;
assim me pacifico, e é por elas
que subo lentamente cada monte.

O tempo arrefecido, e só soprado
por uma brisa tarda que do mar
torna este minuto leve aconchegado,
traz mansas as certezas de se estar.

E vêm novos nomes: são as fadas,
gigantes e anões, que são assim
alegres de o serem — parcos nadas

que enchendo de silêncios este sim
dele fazem brinquedos, madrugadas...
Agora eu estou em ti e tu em mim.

Pedro Tamen,
in “Tábua das Matérias”

Robert A. Heinlein - "O Gato Que Atravessa as Paredes - 2" / "The Cat Who Walks Through Walls"


Robert A. Heinlein
"O Gato Que Atravessa as Paredes - 2" / "The Cat Who Walks Through Walls"
Colecção: Argonauta nº.380
Páginas: 254
Livros do Brasil

Para aqueles que leram o primeiro volume desta obra de Robert A. Heinlein, aviso desde já, que iremos conhecer finalmente o gato que atravessa paredes!

Rui Luís Lima